Publicado em: 16/11/20

Margarete Pedroso

Vivemos em um tempo em que os discursos de ódio se proliferam e em que ser humanista, defender direitos básicos de qualquer ser humano, tem se tornado demérito.

Para o senso comum, direitos humanos são os direitos dos “bandidos”, dos desonestos, dos “vagabundos”. A construção do desmerecimento e da ridicularização do discurso humanitário não é à toa, pois é um dos tentáculos para a subtração de espaços que vinham sendo tomados pelas minorias, tendente ao desmonte do Estado e das políticas públicas inclusivas.

Mas afinal, o que são esses tais direitos humanos?

Direitos Humanos é um conjunto de normas que estabelece direitos e deveres em que, normalmente, uma das partes, é o Estado. Assim, governantes e governados devem se submeter a tais normas. Assim, são direitos humanos: a liberdade, a vida, a dignidade, a segurança, a educação, a saúde, a moradia, o lazer, a cultura, o transporte público, entre tantos outros.

A cidadania é uma relação jurídica decorrente destas normas. Entretanto, para que um cidadão exerça plenamente seus direitos, o Estado deve lhe dar condições para isso, ou seja, assegurar que todos tenham igualdade de condições para exercê-los.

Deste modo, a desigualdade gera a impossibilidade de fruição de direitos que devem ser a todos garantidos e, consequentemente, impossibilita o exercício pleno da cidadania. Também é a desigualdade que mantém certos grupos em situação contínua de privilégio no estrato social, o que gera um círculo vicioso no sistema. Ou seja, as desigualdades alimentam os privilégios que, por sua vez, geram mais desigualdades. É aí, que vem a grande importância de se garantir, por meio de regras escritas (leis, tratados internacionais, etc) que obriguem o Estado a impor políticas e sanções que minimizem ou eliminem o processo de desigualdade.

A desigualdade, por sua vez, pode ser consequência de uma situação econômica, do gênero, da orientação sexual, da raça, do território de origem, de condições pessoais, de limitações físicas ou psíquicas, dentre outras causas. 

Outro ponto importante a ser enfatizado é que não é por meio de atitudes individuais, eventuais e de mera liberalidade travestidas sob a forma de caridade que se resolvem as questões que impossibilitam a garantia dos direitos humanos. A caridade ou altruísmo nada têm a ver com garantir condições adequadas para a fruição de direitos, principalmente porque têm relação com o exercício de poder e com a manutenção das hierarquias entre os desiguais. Portanto, somente uma política de Estado que imponha regras de proteção e garantias às pessoas é que realmente tem o condão de criar condições humanas de dignidade.

Mas a questão que ainda resta é a de saber quem são os desiguais ou quem são as minorias. O fato incontroverso é que os Direitos Humanos nunca foram para todos. Homens brancos, heterossexuais, cisgêneros sempre foram os “donos do poder”, eles, portanto, que, durante toda a história da humanidade, decidiram quais corpos valem mais do que outros e quais espaços podem ocupar.

Há várias premissas que temos que transpor. A primeira é a quem é (ou é permitido ser), dentro de um sistema de privilégios, o humano que tem condições para ser titular de direitos. E mais, quem é o “diferente” que a quem é imposto permanecer à margem da sociedade.

A resposta de quem são os “excluídos” e que se tornam os “desiguais”, pode ser encontrada ao observarmos todos aqueles que fogem do padrão social relacionado à titularidade do poder, ou seja, todos cujos corpos não têm seus espaços sociais garantidos para o pleno exercício de seus direitos com liberdade. De modo que, conforme já exposto, ao excluir grupos de pessoas ao acesso de direitos, alimenta-se a desigualdade e mantém-se um sistema de privilégios

E é daí que nasceu a necessidade de criação de um sistema de Direitos Humanos. O único modo de superar esse sistema de privilégios e desigualdades para garantir o acesso às condições de pleno exercício de direitos é com a observação das leis que instrumentalizam isso, com a fiscalização por parte do Estado e a criação de políticas públicas que viabilizem sua aplicação. Desta forma, lutar pela efetivação dos Direitos Humanos é, hoje, mais do que nunca, urgente e revolucionário. A luta pelos Direitos Humanos é, sobretudo a luta pela garantia de exercício da cidadania e, por consequência de defesa da democracia.

Procuradora do Estado de São Paulo. Graduada em Direito pela Universidade Mackenzie. Especialista em Direito do Estado pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado. Conselheira do Conselho Estadual da Condição Feminina. Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP. Membro da Rede Feminista de Juristas – DEFEMD.

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